Uma dupla muito conhecida

Estou lendo "Comer, rezar, amar" de Elizabeth Gilbert, que ganhei no amigo oculto da Acos. Ouvi opiniões bem diversas sobre ele, mas a maioria dizia que ele era meio cansativo e enjoadinho, e que, ainda assim, merecia não ser abandonado, porque no final a coisa melhora e a história engrena.

Como eu quero muito ver o filme, com a maravilhosa Julia Roberts, e não gostaria de fazer isso antes de ter lido o livro - simplesmente porque essa é a ordem de minha preferência - estava mesmo querendo ler e fiquei feliz de ganhá-lo no amigo oculto. Comecei a ler no mesmo dia e não estou achando cansativo e, tampouco, enjoadinho, o que me dá uma enorme expectativa sobre o final dele, já que o esperado é que no final fique ainda melhor!

Porém, não vim aqui dar a minha impressão sobre o livro - até porque ainda estou na página 68 de 342 -, vim porque no capítulo 16 me deparei com uma dupla que conheci bem durante este ano e porque, como acontece de vez em quando comigo [vide o Coleção de Ideias], achei na Elizabeth Gilbert mais uma autora que escreve e descreve coisas como eu mesma poderia estar fazendo. Então, vim deixar, nas palavras dela, o que eu, obviamente, não traduziria melhor sobre situações minhas.

"(...) Mas quando paro e me apoio em uma balaustrada para admirar o pôr do sol, acabo pensando um pouco demais, e meus pensamentos se tornam sombrios, e é então que as duas me encontram.
Aproximam-se de mim, silenciosas e ameaçadoras como detetives particulares, e me cercam - a Depressão pela esquerda, a Solidão pela direita. Sequer precisam me mostrar seus distintivos. Eu as conheço muito bem. Há anos que temos brincado de gato e rato. Embora eu reconheça que estou surpresa por encontrá-las neste elegante jardim italiano ao entardecer. Elas não combinam com este lugar.
Pergunto a elas:
"Como vocês me encontraram aqui? Quem disse a vocês que eu tinha vindo para Roma?"
A Depressão, sempre bancando a esperta, diz:
"Como assim, você não está feliz em nos ver?"
"Vá embora", digo a ela.
A Solidão, a mais sensível das duas, diz:
"Desculpe, mas eu talvez precise seguir a senhora durante toda a sua viagem. É a minha missão."
"Eu preferia que você não fizesse isso", digo-lhe, e ela dá de ombros, quase pedindo desculpas, mas se aproximando ainda mais.
Então elas me revistam. Esvaziam meus bolsos de qualquer alegria que eu estivesse carregando aqui. A Depressão chega a confiscar minha identidade; mas ela sempre faz isso. Então a Solidão começa a me interrogar, coisa que detesto, porque sempre dura horas. Ela é educada, mas implacável, e sempre acaba me encurralando. Pergunta se eu acho que tenho algum motivo para estar feliz. Pergunta porque estou sozinha esta noite, outra vez. (...)
Volto a pé para casa, esperando conseguir me livrar delas, mas elas continuam a me seguir, essas duas capangas. A Depressão me segura firme pelo ombro e a Solidão me bombardeia com seu interrogatório. Sequer tenho forças para jantar; não quero que elas fiquem me espionando. Também não quero que subam as escadas até o meu apartamento, mas conheço a Depressão, e sei que ela carrega um cassetete, então não há como impedí-la de entrar, se ela decidir que quer fazer isso.
"Não é justo vocês virem aqui", digo à Depressão. "Já paguei vocês. Já cumpri a minha pena lá em Nova York."
Mas ela simplesmente me dá aquele sorriso sombrio, acomoda-se em minha cadeira preferida e acende um charuto, enchendo o aposento com sua fumaça desagradável. A Solidão olha aquela cena e dá um suspiro, em seguida deita-se na minha cama e se cobre com as cobertas, inteiramente vestida, de sapato e tudo. Estou sentindo que vai me obrigar a dormir com ela de novo esta noite."



-------> "Gilbert, Elizabeth. Comer, rezar, amar. Elizabeth Gilbert ; tradução Fernanda Abreu. - Rio de Janeiro : Objetiva, 2008".

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